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quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Tingir cabelo na gravidez eleva risco de leucemia

por Fernanda Bassette e Felipe Oda

Tinturas ou alisadores, durante os três primeiros meses de gestação, aumentam em quase duas vezes o risco de o bebê desenvolver nos primeiros dois anos de vida algum tipo de leucemia.

O uso de tinturas ou alisadores de cabelo durante os três primeiros meses de gravidez aumenta em quase duas vezes o risco de o bebê desenvolver nos primeiros dois anos de vida algum tipo de leucemia, considerada uma das principais doenças oncológicas infantis. Esse risco pode chegar a quase três vezes para um subtipo de leucemia, a linfoide aguda (LLA), que é a variante mais comum da patologia nas crianças e representa 75% dos casos.

A conclusão é do primeiro estudo epidemiológico brasileiro sobre o tema. O trabalho foi realizado pela Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) em parceria com o Instituto Nacional de Câncer (Inca) por mais de dez anos. Os dados sugerem que as mulheres não devem pintar os cabelos em nenhum momento da gravidez, regra que vale também para a henna.

“O estudo mostrou que a doença não se manifestou ao acaso. Há uma associação significativa entre a exposição a tinturas e alisantes com o desenvolvimento de leucemia”, diz o biólogo da ENSP Arnaldo Couto, autor do estudo.

O trabalho foi realizado em 15 centros de todas as regiões do País, exceto a Norte. Foram analisadas 650 mães: 231 com filhos diagnosticados com leucemia antes de 2 anos de idade e 419 mães do grupo de controle, sem filhos com câncer. Segundo Couto, das 231 mulheres cujos filhos tiveram leucemia, 15,2% delas usaram produtos químicos no cabelo no primeiro trimestre da gravidez. Entre as 419 mães de controle, 9,8% usaram tinturas nesse mesmo período.

Foram analisados compostos existentes em 14 marcas de tinturas e alisadores. Num universo de 150 componentes, 32 foram considerados potencialmente prejudiciais à saúde do bebê. “Os compostos mais perigosos são os ácidos, alcoois, aldeídos, aminas, cetonas, ésteres, fenóis e substâncias cloradas”, diz Couto.

No ano passado, quando Rafaella foi concebida, muito antes de a pesquisa ficar pronta, a mãe dela já olhava com desconfiança para as tinturas. Mesmo com o aval de sua médica para o produto, preferiu não arriscar. “Abri mão da vaidade por um tempo. Mas a médica me autorizou a fazer luzes a partir do terceiro mês de gestação”, conta a administradora de empresas Regiane Marques, de 33 anos. Casos como o dela, em que o uso do produto não é proibido pelo obstetra, são comuns: não há entre eles, até o momento, um consenso sobre os riscos desses cosméticos.

Segundo Couto, a estimativa de risco de a criança desenvolver leucemia é 1,8 vez maior em mães expostas aos cosméticos em relação àquelas que não haviam usado os produtos durante a gestação. Mas o risco chega a ser quase três vezes maior no subtipo de leucemia LLA, no primeiro trimestre. “É no primeiro trimestre que o bebê está em formação, existe uma divisão celular intensa e constante. Uma das hipóteses é a de que as substâncias químicas alteram o DNA e modificam a informação genética da criança.”

Maria do Socorro Pombo-de-Oliveira, chefe do Programa de Hematologia e Oncologia Pediátrica do Inca, afirma ter ficado surpresa com os resultados. “É a primeira vez que um trabalho olha para essa direção”, destaca. Mas, segundo ela, o número de casos ainda deve ser alvo de análises experimentais posteriores. O próximo passo, diz, é descobrir qual mecanismo levou aos casos de leucemia.

Os compostos da família dos fenóis, que foram os mais associados ao aumento do risco, já estão sendo estudados pela equipe. Maria do Socorro reforça, contudo, que nenhuma química deve ser usada nos cabelos em nenhuma fase da gravidez, nem mesmo a henna. “A substância da henna atua em uma enzima importante no desenvolvimento das leucemias. Então, mesmo sendo natural, ela pode interagir e trazer riscos para o bebê do mesmo jeito.”

O estudo

A partir do momento em que uma criança com menos de 2 anos era diagnosticada com leucemia em um dos centros parceiros, uma amostra de sangue seguia para o Inca para confirmação diagnóstica. Além de confirmar o tipo de leucemia – LLA ou mieloide aguda (LMA)– os pesquisadores realizavam a entrevista materna, com perguntas sobre hábitos de vida. Para cada mãe com filho com leucemia, os pesquisadores entrevistavam duas mães do grupo de controle – com um filho da mesma idade e sem a doença maligna.

As perguntas eram direcionadas para os três meses antes de a mulher engravidar, os três trimestres da gestação e os três primeiros meses após o parto. “A ideia era identificar fatores ambientais que poderiam ter influência nas leucemias”, diz Couto.

Fonte: Jornal da Tarde - 02/08/2011

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